Na fotografia acima, vista aérea da usina da Belgo-Mineira nos anos 1960
“Certa vez eu ouvi alguém contar que além sob o Arco-Íris há um lugar. Onde o céu sempre azul nos faz sonhar… E a gente consegue os sonhos realizar.”
Houve, em tempos que já vão longe, uma Usina, senhora de que fez nascer uma bela cidade. E com ela encontramos a região tão bela como canta a lenda do Arco-Íris.
Quem a viu nesse tempo e a vê agora, sente a extensão do caminho percorrido pelo empreendimento pioneiro que implantou a civilização industrial em pleno sertão do Rio Doce no Vale do Piracicaba. Setenta e três anos já se passaram, rompendo os horizontes do progresso. Por isso se diz que a vida, Belgo Mineira, João Monlevade, é uma história de pioneirismo já considerada hoje a Universidade do Aço. Monlevade se ergueu em meio às maiores dificuldades, em inóspita região do Piracicaba. Longe da civilização urbana, casebres rústicos compunham uma paisagem primitiva às margens do caudaloso rio. O pulso forte dos pioneiros rasgou novos horizontes e implantou na abençoada terra, a semente da moderna siderurgia nacional. O arquivo fotográfico da minha mãe mostra em detalhe, o que foi a batalha da construção da grande Usina, onde se aliavam dificuldades de toda ordem, em contraposição ao trabalho hercúleo dos pioneiros. Olhando as fotos poderíamos dizer que na fisionomia e na vida de cada um, muito da História da Belgo-Mineira e da cidade que eles viram nascer e crescer com a contribuição do esforço, da competência e da dedicação de cada um deles. João Monlevade e sua gente assistiram nascer e edificaram uma grande cidade. Problemas surgiram, obstáculos foram vencidos; uma Usina se ergueu do nada e ao seu redor um “Pedacinho do Céu.” Hoje minha terra se incorpora à História da Siderurgia Nacional, da qual a solenidade que registra o lançamento da pedra fundamental é um marco, com a Fazenda Solar, embrião do gigante de aço testemunhando a época da emocionante cerimônia.
O valor e a dignidade do operário. Foram eles, interagindo com engenheiros e técnicos europeus, que trouxeram para nossa terra a experiência sedimentada do Velho-Continente, plasmando com o exemplo e os ensinamentos, no campo fértil do homem brasileiro-mineiro-monlevadense, constituíram uma nova e competente equipe que forjou a moderna siderurgia nacional. As fotos históricas registram marco imorredouro. Alguns já descansam no repouso eterno; outros também se aposentaram e estão conosco, graças a Deus, como o amigo, o Velha-Guarda senhor Expedito Evaristo Alves, grande homem, amigo de todas as horas e companheiro do meu paizão, trabalhando juntos uma vida dentro da Usina e outros poucos ainda estão em atividades cercados da admiração e do respeito dos companheiros mais novos. Uma História apaixonante cheia de emoções. As primeiras chaminés dos altos-fornos, aciaria e laminador levantam-se para o céu da nossa abençoada terra. A grande planície às margens do caudaloso Rio Piracicaba, coberta pelas amplas instalações industriais da Usina. Obra que demonstra o engenho e a vontade dos homens. Ampliada pelo tempo, modificada em sua estrutura inicial, mas que conserva o mesmo espírito de seus fundadores – aproveitar a riqueza do solo sem agredir o meio ambiente. Ladeada pela imensa e densa floresta nativa que em grande parte até hoje tem a vida preservada pela Companhia. No serviço de terraplenagem que é, até hoje, admirável pelas dificuldades topográficas da região, eram empregadas as carrocinhas movidas por burro.
O “Burro do Geo”, seus irmãos e seu pai, fazem também parte desta história. Incansáveis pioneiros. Conquistas feitas na época, palmo a palmo, de metro a metro, vencendo grandes e vários empecilhos. Desempenharam os quadrupedantes papel relevante. No dorso principalmente dos burros quase tudo se transportava.
Vamos por um momento esquecer um pouco o passado para focalizar e celebrar o presente; outro capítulo histórico: a Duplicação da célula mater de nossa João Monlevade como centro de um outro vasto plano de ampliação, de desenvolvimento econômico e social do Vale de uma região tão bela onde o céu sempre azul nos faz sonhar… E a gente consegue os sonhos realizar. A duplicação da capacidade de produção da ArcelorMittal, projetará a nossa João Monlevade no cenário nacional além de garantir expansivo desenvolvimento municipal com a geração de novos postos de trabalho e mais arrecadação de impostos.
E como bem escreveu o meu amigo Francisco de Paula Santos no quadro Olhar Sobre A Cidade, do Jornal A Notícia – “Seja Belgo-Mineira ou ArcelorMittal, a Usina de Monlevade é, e sempre será um marco na História do aço no mundo – e motivo de progresso e orgulho para nossa cidade e região.”
Hoje estampamos também gloriosa etapa: perspectiva de grande empreendimento e início de vitoriosa jornada. O exemplo, a fé dos pioneiros permanecem vivos mostrando para as gerações atuais que não há obstáculos intransponíveis na batalha permanente pelo progresso de nossa terra. O espírito indômito e infatigável de Louis Jaques Ensch, precursor de grandes iniciativas, engenheiro de visão e progressista há muito já se instalara às margens do Piracicaba.
A História de minha terra através dos tempos, através de fotos antigas, me fascina. Meus pais sempre me diziam que a História de João Monlevade é um hino de louvor à
bravura de nossa gente.
Sempre que passávamos, mamãe e eu, pela “Estrada da Saudade”, aquela da Fazenda Solar, a mamãe fazia o sinal da cruz e começava a rezar. Sendo ela muito católica e muito rezadeira, achava eu normal. Até que começou, todas às vezes que descíamos para sua casa, pedir para parar naquela bela entrada da Fazenda e lá ficávamos alguns bons minutos. Ela saudosa falava sobre o passado, eu adorava, e depois fazia suas preces.
Então, numa dessas paradas, não sei o porquê, resolvi perguntá-la para quem rezava todas às vezes que ali passávamos. Se, era para algum santo ou santa de sua devoção lá da capela da Fazenda.
Aí, mãe me olha bem nos meus olhos com aquele seus olhos verdes lindos, bem abertos e diz: Dr. Ensch e Dr. Hein; dois santos homens.
O quê? Não acredito mãe. Eles santos? Isso mesmo, são uns santos e estão no céu e no meu coração. Mamãe, meus ouvidos não estão ouvindo isto. Presta atenção… Que sandice é essa agora? A senhora destemperou? Faça-me o favor. Só faltava essa. Olha a língua, Coramar. Ponha tento no que fala e você me respeita.
Entramos no carro e lá fomos nós pela estrada afora, discutindo – santo ou não? Até que em um dado momento ela brava gritou: Olha e você cala essa sua boca. Para mim filho não tem idade. Já falei que eles são santos e pronto. Eu é que sei o quê esses dois homens, heróis, boníssimos, passaram aqui no princípio de Monlevade. Se não fossem eles Monlevade não existia. Eu é que sei. Sempre ajudavam à população. Tudo faziam para o bem comum do empregado da Belgo e sua família.
Mas a controvérsia continuou… Mãe, tudo bem a senhora rezar pela alma deles, contudo dizer que eles são santos? Não posso concordar. E mamãe confirmava: Santos sim. Tenho plena convicção. Eu ainda vou escrever para Sua Santidade o Papa pedindo para canonizá-los. Tem tanto Santo por aí que não fizeram nada, não fazem nada, e são chamados de Santos. Vou escrever e dizer isso para o Papa. Doutor Ensch e doutor Hein merecem.
Nesse momento,já quase chegando à Rua Siderúrgica, eu dei aquela sonora e gostosa gargalhada. Mãe, agora a senhora destemperou de vez. Vou levá-la ao médico, urgente.
Oh dor! O roxo durou um bocado de tempo! Minha fala custou-me um forte e terrível beliscão na coxa direita e outro no braço. Saudades da mamãe. Ela era o máximo!
Hoje, todas às vezes que passo, e são muitas, ali na “Estrada da Saudade”, sem ela do meu lado, em sua homenagem, rezo pelos três. Agora dois “santos” e uma “santa”, sem chorar e sem tristeza, só saudades.
Somente a fé invencível dos pioneiros pôde construir esse gigante de cimento e aço que é João Monlevade, um lugar tão belo onde o céu azul nos faz sonhar e a gente consegue os sonhos realizar.
*Coramar Alves é professora aposentada e foi colaboradora do “Morro do Geo” durante vários anos! – Esta coluna foi publicada na edição de nº 120 do jornal, em abril de 2008!