Tendo como apoio uma Kombi da Monbel, eu (de bolsa a tiracolo) , nos meus vinte e poucos anos (rs), e o jornalista Pascoal, em frente à Portaria do Zebrão, durante cobertura da história disputa pela sucessão no Sindicato dos Metalúrgicos, em 1987
Também naquele ano aconteceriam as eleições sindicais e, após vários anos sem uma disputa, a empresa resolveu mudar sua estratégica e acabou convencendo um grupo de operários de que era preciso haver mudanças no comando do Sindicato dos Metalúrgicos. Aproveita-se também dos últimos acontecimentos, como a greve dos 23 dias, no ano anterior, tentando convencer os operários da Usina de que havia muito mais interesses políticos em jogo, por parte dos dirigentes sindicais, do que a luta em prol da categoria. Dessa forma, o então gerente da Usina da Belgo-Mineira em Monlevade, engenheiro Alonso Starling Neto, conseguiu o que parecia improvável, e foi montada uma chapa de oposição, a Chapa-2, encabeçada pelo metalúrgico Pedro Pesce, o popular “Pedroca”. Pela situação, Antônio Ramos, que ocupava o cargo de secretário geral, encabeçava a chapa.
Poder-se-ia dizer que, na história sindical que eu presenciava, seria a primeira disputa com uma campanha mais acirrada. E não apenas no interior da Usina, ou nas imediações das portarias, como em frente ao Vestiário Central, o Zebrão, mas em toda cidade, como se fosse uma eleição municipal. Sem contar as provocações e troca de farpas, como classificar uma chapa de “pelega” e a outra de “radical”. E Ramos tinha consigo uma imagem de agressivo e radical ao extremo. Daí, um certo receio da classe empresarial de tê-lo como presidente da entidade sindical. Para eles, o clima entre Belgo e Sindicato poderia ser o pior possível e quem sofreria as consequências seria a comunidade. Havia um exagero exacerbado contra a figura do Ramos que, se fosse hoje, seria comparado a um extremista. Eu, particularmente, jamais acreditei na imagem com que o pintaram, e via naquele homem uma pessoa sensível, “bom vivant” e amante da boemia. No entanto, dentro do grupo, junto aos companheiros, sempre foi respeitado justamente pela sua coragem de sempre colocar a cara à frente. Mesmo diante deste cenário sobre o excesso de radicalismo pelo cabeça da Chapa-1, a princípio dava-se a impressão de que a chapa de situação venceria com muita facilidade, mas, aos poucos, o quadro foi se nivelando, principalmente pelo apoio quase explícito por parte da empresa e pelas pressões contínuas no corpo a corpo, Os supervisores tinham de tomar partido e se viram obrigados a pedir votos para a Chapa-2.
Eu, como repórter da Rádio Tiradentes/Globo e do “Tribuna de Monlevade”, dedicava meu tempo à disputa, cuja campanha durou de maio a agosto de 1987, mês em que ocorreram as eleições. Foram três meses de uma campanha acirrada dos dois lados. Entrevistas eram frequentes até o dia “D”, no mês de agosto daquele ano. Instalamos o “QG” da emissora em frente à portaria do Zebrão, onde tudo acontecia. Fizemos a cobertura. eu e o repórter Pascoal de Souza, e uma Kombi servia como nosso ponto de apoio. Mas, durante a votação não tínhamos um link para as transmissões ao vivo da portaria do Vestiário Central, ou seja, uma linha direta com a Telemig – então a empresa de telecomunicações do Estado -, o que prejudicava em muito as nossas intervenções. A maneira foi encontrar uma saída prática e ainda havia moradores na antiga Rua dos Contratados, próximo ao Zebrão e, entre eles, o amigo Raimundo Formiga, o “Fufu”. Dessa forma, de hora em hora, corria até a casa dele e fazia uma ligação telefônica direto para o estúdio da emissora, mantendo os ouvintes informados com as atualizações. Ao final da votação, nos deslocamos até a sede do Sindicato, na Rua Siderúrgica, onde seria realizada a apuração. Mas foi um dia de cão, e ali na portaria do Zebrão era normal ver e ouvir provocações de ambos os lados, e algumas delas quase terminaram em vias de fato. Mas, felizmente, as agressões ficaram apenas na verbalidade!
São muitas as histórias, impossível registrar todas… Uma, entretanto, não pode deixar de ser relatada: o nosso patrão, o diretor da Tiradentes/Globo, saudoso José Inácio. Um profissional de uma inteligência e capacidade raras, capaz de enxergar à frente. Tanto que foi ele quem transformou o radialista Carlos Moreira nessa potência junto às massas, o que, consequentemente, acabou gerando para o mesmo grandes dividendos políticos. Também não posso deixar de expressar minha gratidão ao José Inácio, por ter aberto as portas para que pudesse produzir meu próprio programa jornalístico, que era um sonho profissional e foi líder de audiência. Tanto a ele quanto o seu antecessor, Elmar Venícius de Oliveira, que me deu também todo apoio.
Mas José Inácio tinha um problema, que era o seu alcoolismo, e aquilo o tirava do sério às vezes. Tanto que, enquanto ocorria a apuração na sede do Sindicato – e lá havia o link ligado para transmissões ao vivo, o que muito facilitou nosso trabalho -, o chefe se encontrava no Bar e Restaurante Rampa´s, onde deve ter esgotado a cota de conhaque do então proprietário, Antônio Cota. Quando a apuração aproximava-se do final e já com a vitória garantida da chapa-1, convido Antônio Ramos para uma entrevista. O lugar estava lotado, gente gritando, comemorando, muito barulho mesmo! E começo a conversa com o presidente eleito, quando chega o José Inácio, completamente embriagado e aos berros, querendo que Ramos se aproximasse dele. Mas, no momento, ele me concedia a entrevista e mesmo assim o Inácio insistia. Comecei a sair do sério, cansado pelo stress daquele dia todo de trabalho árduo, sem banho e sem comida. Foi quando perdi a boa, larguei o microfone e parei a entrevista no meio. Ramos continuou falando até que a ficha do José Inácio caiu e ele, sem graça, foi se desculpar. Foi quando retornei ao posto e terminei a entrevista. Logo depois, o chefe entrou no ar, continuando a conversa com o novo presidente e, nesse momento, fui embora de vez. Não queria testemunhar nenhum vexame ao vivo, mesmo porque José Inácio não tinha condições de falar com ninguém.
E ocorreu o que já se esperava. A apuração final se deu logo depois, oficializando a vitória de Antônio Ramos, pela Chapa de Situação, que obteve 2.043 votos, contra 1.082 do oponente Pedroca. A empresa, que desejava o afastamento da chapa situacionista, era derrotada. A posse da nova diretoria se deu no dia 1 1 de setembro e, ao contrário do que muitos acreditavam, o discurso de posse do presidente empossado, Antônio Ramos, foi bem moderado. Com a sede lotada, ele não teceu qualquer tipo de crítica à empresa e preferiu manter um tom sereno, sem qualquer agressividade. Entre as autoridades presentes, estavam o deputado federal constituinte João Paulo e o deputado estadual Chico Ferramenta.
Na foto abaixo, o grande número de metalúrgicos da Belgo-Mineira durante a votação para escolher o novo presidente e a Diretoria do Sindicato. À frente o então prefeito Germin Loureiro, observando os trabalhos, e ao centro, de braços cruzados, o candidato da situação, que saiu vitorioso, Antônio Ramos

*Do Livro A Saga: Memórias de um Jornalista do Interior” – Parte XV
Autoria: Jornalista Marcelo M. Melo!
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