Julinho, com sua tradicional boina, em família: com o filho Eudes e a esposa Maria (Arquivo: Álbum de Família)
Era um mês de junho, início da década de 1960, quando por volta de 17:30 horas o nosso personagem desce do ônibus (ou jardineira), na antiga Rodoviária na rua Beira Rio, vindo de sua terra natal, a acolhedora São Domingos do Prata.
Nascido e criado naquela cidade, suas características não poderiam ser diferente; calmo, educado, bom caráter e, sobretudo, muito inteligente, além de ser um grande gozador e excelente músico. A princípio, pelo que se sabe tratava-se apenas de um passeio na casa de uma tia e o regresso seria em breve.
Com seus passos em ritmo de urubu malandro, nosso personagem, que além de músico é também ótimo barbeiro (no sentido de trato do cabelo e não de motorista), tomou o rumo do centro da cidade, que na época era a praça do Cinema. Assim, calmamente, seguiu pela rua Beira Rio, subiu o morro que dava acesso ao Cassino e, ao chegar no antigo Bar do Moacir – anexo ao Hotel Siderúrgica -, avistou perto do bar do Daniel (que depois passou a se chamar Rampas e hoje é o Silva Mendes), um certo aglomerado de pessoas. Nesse instante a curiosidade falou mais alto e, matreiramente, aproximou-se e viu que parecia ser uma fila. E de fato era. – Mas fila, pra quê fila? Pensou.
Não suportando a curiosidade aproximou-se das últimas pessoas que estavam na fila, mais precisamente um casal, e perguntou: – por favor, o senhor poderia me informar para que esta fila? – Pois não, é para comprar ingresso para a primeira seção no cinema, respondeu-lhe o educado senhor.
Com esta resposta, nosso personagem, músico e barbeiro, ficou baratinado e pensou; “pôxa, se o cinema está lá em cima e esta fila deve ter mais de quinhentas pessoas só para a primeira seção, é claro que o filme é um clássico, e eu não vou perder de jeito nenhum”. Lá foi ele para a fila.
Devagarinho a fila foi andando morro acima. Ao chegar próximo à linha férrea, perto da antiga leiteria, nosso personagem olhou para trás e viu que a fila ia só aumentando, pois o final ainda estava lá perto do Rampas. Isto só serviu para aumentar sua ansiedade. Enquanto a fila ia se movimentando, ele ia pensando: “Puxa, como sou de sorte; é difícil eu vir a Monlevade, e logo hoje que eu venho é exatamente o dia que irá passar um clássico do cinema, e vou conseguir assistir. Com essa, amanhã vou deitar e rolar, vou contar o filme para a turma toda lá no Prata. Eles não vão nem acreditar”. A fila ia subindo e a ansiedade aumentando.
Em Tempo: Antes de concluir esta história, torna-se necessário um registro importante e que demonstra a merecida popularidade do nosso personagem. É que aqui em Monlevade tem uma rua (ou morro) que foi “batizado” com seu nome pela própria população, e não por lei ou decreto. Mas o cara merece: o “Morro do Julinho”, que liga o Bairro Areia Preta à Vila Tanque.
Finalmente nosso amigo chegou na bilheteria. Muito inteligente, não titubeou, comprou logo dois ingressos, um para a primeira e outro para a segunda seção. É claro que iria assistir às duas seções, pois não poderia perder nenhum detalhe do filme. Adquiriu os ingressos e pegou outra fila para entrar no cinema. Ao entrar, nem se preocupou em olhar o cartaz do filme, pois o que interessava era conseguir um bom lugar para assistir o clássico. O resto não vinha ao caso. Conseguiu o lugar desejado e acomodou-se. A sua mente fervilhava, não suportava esperar. Tamanha era a ansiedade que nem ao banheiro foi, embora vontade não faltasse. Finalmente, ouviu a sirene que indicava que a seção iria iniciar. Consertou o corpo na poltrona, esfregou as mãos, relaxou, respirou e fixou o olhar na tela. Apagaram-se as luzes. Iniciou os “reclames”, em seguida o futebol pelo canal 100. Nosso personagem já não aguentava esperar o filme. Olhos arregalados, respiração ofegante e estava até suando, Enfim, vai começar o filme. Nosso amigo nem piscava. É agora! Pensou. E realmente foi, pois na tela apareceu o título do filme “O Corintiano”, com Mazaropi e Cia. Nessa hora, de raiva as lágrimas saíram dos seus olhos. Ele tirou os olhos da tela, abaixou a cabeça e pensou com seus botões: é nessa terra que vou ficar rico, aqui só tem trouxa. E realmente ficou, aliás, merecidamente.
Eu desejo que nosso amigo continue fazendo suas corridas pela Avenida Wilson Alvarenga, pois assim continuará saudável e nos proporcionando muitas alegrias em razão da sua alegre forma de se comunicar.
*Este artigo foi escrito pelo saudoso Sebastião Eustáquio (Taquinho Advogado), e publicado na edição de nº 117 do jornal “Morro do Geo”, em janeiro/2008.