Campo de Aviação de João Monlevade, assim chamado o Aeroporto de nossa cidade, inaugurado em 1956. Desativado há décadas e fechado há alguns anos, foi o local onde desapareceu o menino
Estávamos em mais um ano eleitoral e as coisas aconteciam com muita rapidez. Minha labuta continuava entre a rádio e o jornal. No governo do prefeito Diniz foram registradas algumas mudanças e, para amenizar a situação junto à Executiva Municipal, alguns militantes da cidade foram contratados para ocupar cargos de confiança na Prefeitura. Entre eles, José Theodoro, que assumia a pasta de Administração. O ano mal começava e a administração do PT se envolvia em uma briga que – assim pensava a equipe do prefeito Leonardo -, poderia render votos nas eleições daquele ano e manter o partido no poder. Dessa forma, se arrastou por vários meses a luta judicial entre o governo e o construtor Ivo Pires, proprietário de uma área no centro da cidade, precisamente na Avenida Wilson Alvarenga. Era proposta da Prefeitura construir ali uma praça, para ser inaugurada em abril daquele ano, nas comemorações do 28º aniversário de João Monlevade, mas Ivo Pires, que já havia recebido Cr$ 23 milhões vinte e três milhões de cruzeiros (dinheiro da época), para desapropriação da área, mas reivindicava um valor maior . Como não foi atendido, entrou na Justiça e a obra foi embargada. A luta durou meses na Justiça, ora com a obra em andamento, ora embargada. O caso terminou em favor do governo, que conseguiu inaugurar a praça com meses de atraso, pouco antes das eleições municipais, com um grande show do cantor e compositor Martinho da Vila. A praça esteve lotada e tive o prazer de estar presente, mesmo porque sempre fui um fã aficionado do grande sambista José Ferreira, seu nome de batismo. Mas, até que a praça fosse inaugurada, outros fatos ocorreram e até atos de vandalismo, por parte de alguns militantes petistas que ocupavam cargos de confiança no governo do prefeito Leonardo Diniz, foram registrados. Eles chegaram a derrubar as placas instaladas no local pelo proprietário do terreno, Ivo Pires, além de promoverem pichações em murais que cercavam a obra quando estava embargada. Coisa comum entre ações de militantes petistas!
Entre esses pichadores, uma história que merece registro. Estávamos para fechar a edição, numa manhã de quinta-feira. E chega a informação de que um assessor do 1º escalão teria sido detido ao ser flagrado pichando o muro. Saí da redação às pressas, direto para a Delegacia. Busquei de todas as formas entre as polícias Militar e Civil alguma informação, mas nada. Naquela altura do campeonato, o nome do tal assessor – que já havia sido liberado – estaria sob sigilo. Estava quase desistindo, quando um escrivão da Polícia Civil, José Maria, me chama ao canto e me passa o nome do elemento. Tratava-se de João Baptista Santiago, titular do Departamento de Planejamento. Corro para a redação e, após quase uma hora de pesquisa, conseguimos encontrar uma foto do tal assessor: na edição de sexta-feira, a manchete que vende todos os exemplares nas bancas , com a matéria de capa do pichador da Praça do Povo e sua foto estampada.
No entanto, nem só de política vive a imprensa: um caso policial viria chocar toda a população monlevadense, até hoje não solucionado. Seria o desaparecimento do menino Juliano Marques, de 11 anos na época, que no dia 3 de maio de 1992, desapareceu no campo de Aviação. Ele havia saído de sua casa, no Bairro Laranjeiras, onde morava com a mãe, a funcionária pública Matutina Soares Marques, e irmãos. Estava em companhia de outros dois menores, tendo umdeles afirmado que teria violentado sexualmente a criança e chegou a ficar apreendido durante um período . O Corpo de Bombeiros da Polícia Militar e até funcionários da Prefeitura ficaram durante dias procurando pelo menino no local e na região, sem nenhum sucesso. As buscas foram paralisadas dez dias após o desaparecimento. Hoje, mais de três duas décadas depois, não se tem notícias de Juliano Marques, e se está vivo ou não. Porém, sua mãe, Dona Matutina ainda tinha esperança de encontrá-lo. E o outro rapaz, réu confesso de ter estuprado Juliano no no dia de seu desaparecimento, continua em liberdade e, como muitas vezes ocorre entre os marginais, tornou-se evangélico e como todo “convertido”, jura arrependimento. E sempre que o via perambulando pelas ruas da cidade, o sentimento é de revolta e repulsa.
Infelizmente, o fato ocorreu e sentenciou para sempre uma família, após um passeio mal acabado no antigo aeroporto de nossa cidade. Ali do alto do Bairro Vila Tanque. Um lugar que, durante alguns anos foi usado como um templo recreativo, onde eram realizados os saudosos festivais de pipas, mas que também era trajeto obrigatório para aprendizes de motoristas, no tempo que não havia a “máfia” das auto-escolas. Ou ainda, o point para acampamentos de jovens moças e rapazes ou piqueniques entre famílias. Hoje, está totalmente isolado e fechado à comunidade, por ordem do indiano. Em João Monlevade, as coisas são diferentes da modernidade do mundo, porque as portas costumam mais se fechar do que abrir. Mesmo porque a “Mãe” Belgo-Mineira tornou-se a “Madrasta” ArcelorMittal. Assim aconteceu com a Serra do Seara e com o Campo de Aviação.
Servidor morre dentro da Prefeitura
Minha vida de repórter prosseguia, sempre ligado nos fatos. E, entre tantos casos, lembro-me de mais um; a prova viva de que os “passarinhos verdes” (informantes) que tínhamos de dentro da máquina administrativa realmente eram muito rápidos nas informações. Na redação localizada ali na Rua Brasília, 104, o telefone toca. Uma voz do outro lado, sem que a pessoa se identificasse, comunica que um funcionário público municipal acabava de falecer dentro do banheiro do prédio da Prefeitura, depois de ter sido negado a ele uma consulta na Policlínica. Apanho a máquina fotográfica e saio em disparada no velho Fiat 147. Chego à Prefeitura com a “ferramenta” pendurada no pescoço e a primeira pessoa que vejo é justamente o chefe do Departamento de Administração, José Theodoro. O relógio marcava meio-dia e não fazia 10 minutos que havia sido registrado o óbito. Nem a perícia havia chegado ao local, embora isso não seja novidade, pois na maioria das vezes eles são os que mais se atrasam. Nesse instante, Theodoro me olha, dá um sorriso discreto, em tom de gozação, e vai logo falando: – “Marcelo, o camarada nem morreu ainda e você já está aqui! Seus informantes são bons mesmos, hein! Afinal faltam ainda cinco minutos para o fato acontecer”. O clima foi quebrado e ambos seguramos para não darmos umas boas risadas. Afinal, era preciso respeitar a memória do funcionário que acabara de falecer, ali, próximo de nós.
O que sei dizer é que o óbito gerou muita polêmica e custou caro ao governo do prefeito Diniz, que teve sua imagem ainda mais desgastada perante a opinião pública. Isso, poucos meses depois de ter autorizado o caminhão-pipa da Prefeitura a encher a piscina da casa do então açougueiro Caetano, localizada na Rua Ricardo Leite, enquanto a população de sofria com a falta d´água.
*Do Livro A Saga: Memórias de um Jornalista do Interior” – Parte XXXIV
Autoria: Jornalista Marcelo M. Melo!