Para ilustrar o artigo, uma fotografia do Quartel da PM em João Monlevade. Na minha época, as Polícia Civil e Militar funcionavam no mesmo prédio, onde é hoje o presídio
Chegaria 1994, vida nova e um novo arrebento a caminho. Eu continuava com meu trabalho de editor no “A Notícia” e com o programa vespertino na emissora de rádio. Pelo jornal, fazia um pouco de tudo para cobrir a falta de Chico Franco. Na época, contratamos um repórter, que fazia o noticiário policial. Às vezes, o trabalho era executado por mim mesmo, em razão de maior experiência e de saber lidar com situações adversas. No entanto, sempre gostei de cobrir matérias policiais. Mas o meu “braço direito” era mesmo o Dalton Passos, filho do Ivan e que, apesar de inexperiente, tinha vontade de mostrar serviço e gostava do que fazia. E, entre tantos fatos, três marcaram minha passagem como repórter policial naquele período, um deles chegou a ser hilário e não nego o medo que senti quando precisei fotografar um detento. O caso envolvia um empresário de Belo Horizonte, casado com a filha de um comerciante de Monlevade que, não aceitando a separação, veio atrás dela na cidade. Após acirrada discussão, ele chegou a apanhar uma faca para golpeá-la, o que fez com que sua ex-esposa saísse correndo e ele atrás, pela avenida de Carneirinhos. Algo que se vê em filmes policiais, e uma tragédia somente não ocorreu porque a Polícia conseguiu detê-lo, dentro da sede da Construtora Ferreira Júnior, próximo ao ex-campo do Flamengo.
Dia de fechar a página policial e chego eu na DP. Como era de praxe, o carcereiro pediu para que aguardasse no pátio até que ele buscasse o detento na cela. No entanto, sempre o policial vinha junto do detento, e nesse intervalo estava de cabeça baixa, colocando o filme na máquina, e por isso não vi quando se aproximou de mim aquele homem alto, branco, de bermudas rasgadas, barba por fazer e muito forte, lembrando um guarda-roupa aberto. Com voz grave e de poucos amigos me encarou e perguntou para quem eu iria fotografar. Uma luz chegou na hora e não me hesitei. Veio a resposta na ponta da língua: – “Sou da Inspetoria e esta foto é apenas para nossos arquivos”. Jamais poderia falar que era repórter policial e que a foto sairia no jornal. Afinal, estávamos só nós dois, porque o carcereiro não apareceu. Saí dali bem assustado, mas com o dever cumprido (rs).
O outro ocorrido na área policial foi mais complicado e obrigou-me usar de muita diplomacia. Tudo sem perder o foco profissional. Quase fui massacrado por alguns membros de uma entidade que atua na cidade por ter publicado uma matéria, com foto, sobre um rapaz de família influente que havia sido detido por tráfico de drogas. Havia recebido um telefonema na redação, direto do delegado de Plantão, comunicando sobre a prisão de seis pessoas, por tráfico e uso de drogas. Na época, maconha era o entorpecente mais comum. Dois deles, os quais este filho de comerciante e um outro elemento, estavam incursos no Art. 12 (Tráfico), e os demais no Art. 16 (Uso). Como repórter policial, sempre usei uma tática: não colocar fotos de usuários de drogas em jornal, mas apenas dos traficantes. Dos demais, só os nomes, e foi o que fiz. E sairiam as fotos dos dois que foram incursos no “12”. Naquela altura, não imaginaria a pressão que sofreria logo depois de ter deixado a DP. Isso porque o pai do acusado, pessoa influente, com apoio de vários colegas da entidade, procurou o Márcio Passos para que intercedesse no caso com objetivo de não se postar a foto do rapaz. Ele disse que conversaria comigo. Márcio me chamou e disse que apoiaria a decisão que eu tomasse. Argumentei que ou colocaria a foto dos dois ou de nenhum deles. Isto porque, o outro envolvido já tinha passagens pela Polícia enão seria problema estampar sua fotografia na página do jornal. Tive um dia para refletir e cheguei a receber dois telefonemas como forma de me convencer a redigir apenas a matéria, sem a foto. Decisão tomada: na sexta-feira seguinte a matéria era a chamada da página policial com as fotos dos dois acusados de tráfico de drogas. E, sinceramente, não me arrependi daquela decisão, que me custou alguns transtornos futuros e até inimizades, além das “caras fechadas”. O tempo, no entanto, fez as feridas se cicatrizarem e os rancores foram deixados de lado. Tanto que, pouco anos depois, a então esposa daquele rapaz detido foi minha secretária quando atuei como assessor de Imprensa na Câmara Municipal. E ele próprio nunca me tratou com hostilidade, muito pelo contrário, e hoje somos bons amigos. Afinal, são os ossos do ofício!
E, para fechar este ciclo policial, outro que não poderia deixar de citar foi sobre um caso ocorrido em Belo Horizonte. O elemento havia assassinado o seu filho, de 9 anos de idade, atirando o corpo da criança no Córrego do Onça, na capital. Depois de fugir, acabou sendo preso no município de Santa Bárbara e transferido para a 27ª DRSP, em João Monlevade. Fui então até a Delegacia para entrevistar o criminoso e, lembro-me de ter usado a mesa do escrivão, José Newton, para fazer meu trabalho. Alguns detetives também estavam na sala, entre eles Geraldinho (hoje agente da PRF), Carlinhos e Edson. Entre uma pergunta e outra, questionei ao detento sobre o motivo pelo qual ele havia cometido aquele bárbaro crime, contra o próprio filho, quando me respondeu: – “Eu mandei ele me pedir benção e ele não pediu. Aí o matei e antes fiz ele engolir muita pimenta”. Meus olhos quase pularam para fora de tanta revolta e ódio daquele elemento, ali, à minha frente, relatando com a frieza de um psicopata (porque nem animal faz isto por prazer) aquele episódio. Não me segurei e dei-lhe um soco na boca do estômago, quando fui contido pelos policiais. Depois alguns deles o levaram até o pátio externo, onde havia uma plantação de pimenta, e enfiaram goela adentro. Nunca me arrependi de ter agredido aquele assassino, que já deve ter ido para o inferno.
*Do Livro “A Saga: Memórias de um Jornalista do Interior” – Parte XLIV
Autoria: Jornalista Marcelo M. Melo!