Na fotografia acima, no dia da entrevista, Sr. José Pedro e o filho “Nico”
Uma das boas reportagens que fizemos nas primeiras edições do “Morro do Geo” foi com o taxista José Pedro da Silva, conhecido como “Doce de Leite”, pela simpatia que sempre lhe foi peculiar. A entrevista se deu em sua casa, ali no Bairro de Lourdes, acompanhado de seu filho “Nico”, também taxista. Precisamente na edição de nº 04. de abril de 2001, na época ele estava com seus 86 anos bem vividos. Ele veio a falecer alguns anos depois.
Seu José Pedro chegou a João Monlevade aos 25 anos de idade, para trabalhar na obra de aterro durante construção da Barragem do Jacuí. Neto de espanhóis, ele aportou aqui na carroceria de um caminhão, e foi trabalhar na Nicácio Construções. De uma memória invejável, ele recordou daquela tarde de 1940, quando o caminhão fez uma parada em um campo de lavoura, na cidade de Rio Casca, procurando homens para trabalhar na construção da Barragem. “Viemos eu e alguns colegas. Morávamos em barracos e durante oito meses fiquei na obra. Até que um belo dia, um gringo da Suiça, conhecido como “Sr. Frangote” , começou a observar a forma como eu trabalhava. Sempre fui muito ligeiro, e aí ele me perguntou por que ainda não estava na Usina. Lembro-me que lhe disse que faltava uma pessoa para me dar uma força, quando ele respondeu: – Agora tem. Fui admitido então na Cia. Siderúrgica Belgo-Mineira, onde comecei a trabalhar como apontador, depois como turbineiro até chegar ao cargo de operador elétrico, na Subestação”, relembrou saudosista. E na Belgo-Mineira aposentou-se em 1972, com mais de 30 anos de serviços prestados. E sobre o gringo suíço a quem sempre teve gratidão, Sr. José Pedro disse durante nossa conversa que “foi um anjo da guarda que surgiu em minha vida e depois transferiu-se para Belo horizonte e nunca mais tive notícias dele”. Mas, junto à vida de metalúrgico dentro da Usina, ele resolveu também entrar no ramo de motorista de praça o que ocorreu em 1942.
Sr. José Pedro, um dos primeiros motoristas de praça em João Monlevade, fala do dia em que uma passageira deu a luz em seu Ford/29!
Com dois anos de Usina e residindo em uma barraca no Jacuí, ele conheceu a senhorita M aria Cândida, que era lavadeira, e foi amor à primeira vista. Seis meses depois do início do namoro estavam casados, e logo depois o casal mudou-se para o Bairro Vila Tanque. E naquele mesmo ano, em 1942, resolveu comprar seu primeiro automóvel, o Ford/29, e tornou-se um dos primeiros taxistas de João Monlevade, somente deixando a praça mais de 50 anos depois, ou seja, em 1995. O ponto dos “choferes” – como se dizia na época – era ali na Rua Beira-Rio, ao lado do Terminal Rodoviário, onde estacionava seu tesouro junto a outros colegas da praça. E no seu táxi foram muitas histórias vividas, e uma das mais emocionantes foi no dia que uma senhora deu a luz dentro do velho Ford. Ele lembrou que um senhor chegou apressado na Rodoviária e pediu para que fizesse a corrida para a casa de uma senhora, na Serra do Andrade. “Tudo ainda era estrada de chão e fomos para lá, junto ao marido e sua esposa grávida. Mas resolvemos ir direto para o Hospital. No maio do caminho a bolsa arrebentou e a criança começou a nascer. Foi um susto danado, mas garças a Deus deu tudo certo com o parto. No Hospital, logo que chegamos, a mãe e a criança foram atendidas pelo Dr. Mário capela, uma pessoa muito boa. Este foi um dos casos que não se esquece”, concluiu.
Ele falou também com saudade da Praça da Rua Beira-Rio, onde o seu velho Ford ficava sob as mangueiras, assim como os demais veículos, de outros taxistas, e ele recordou com saudade de todos colegas da praça, entre os quais Sr. Randolfo, Manoel “Paciência”, Levi Vasconcelos, “Bengala”, “Nonô Babão”, Alemão e Bentão. E lembrou ainda das procissões, que ele e Randolfo organizavam durante o Dia de São Cristóvão, com orgulho.
A vida do Sr. José Pedro, no entanto, não tinha muita folga para atividades sociais. Era muito trabalho, entre a Usina e a praça. Mas uma coisa era sagrada! Todos os anos levava a esposa para Aparecida do Norte, durante os festejos religiosos. E, como gostava de pescar, outras vezes as pescarias com amigos na Lagoa Grande. No mais, trabalho e trabalho, mas tinha ainda um tino comercial. Nas horas de folga comprava uma radiolas, bicicletas e outras mercadorias na Loja Orton Bráz, de propriedade do comerciante Whashington Bráz, em Nova Era, para revender em João Monlevade. Disse que nem mesmo de futebol gostava. “Uma vez vi um tio meu tomar uma surra no estádio do Jacuí, e tomei birra de futebol. Nu nca mais voltei ao campo”, afirmou.
Viúvo e pai de três filhos, com 12 netos e uma bisneta no dia da entrevista, ele gostava de alimentar-se bem e não perdia um noticiário policial. E disse orgulhoso: – “Nunca bebi e nunca fumei. A coluna que está um pouco ruim, mas quando saio, vou longe, a pé”, gabou-se, sempre sorridente.
Na fotografia abaixo, quando recebia o Relógio “Velha Guarda” da Belgo-Mineira pelos 25 anos de serviços prestados, pelas mãos do gerente da Usina. Dr. Luiz Carlos de Andrade

Matéria publicada na edição de nº 04 do jornal “Morro do Geo, de abril/2001.