Dr. oscar Falcão de Almeida ao lado da esposa Dona Rose, que viveram durante muitos anos no Vila Tanque, em João Monlevade
Quem viveu em João Monlevade, nas décadas de 1960 a 1980, certamente conheceu o Dr. Oscar, cirurgião-dentista,um profissional competente, ético e muito popular. Gostava de uma boa conversa com qualquer interlocutor. Era bastante atencioso, acessível e não fazia distinção entre pessoas.
Inteligente, profundo conhecedor de história universal, versado em idiomas, era sempre convidado para ministrar palestras e conferências em instituições de ensino, devido à sua peculiar cosmovisão.
Tinha o hábito de trabalhar cantarolando. Era devoto de São Pedro: no seu consultório, sempre havia uma flor natural depositada ao lado do quadro do padroeiro, ofertada pelos clientes. Amava as longas viagens com a família pelo Brasil afora. Era um nacionalista nato, um nordestino arraigado às suas origens. Um cliente mais observador poderia notar o brasão do seu estado natal, Alagoas, na base do aparelho de Raios-X . Foi membro da comissão que estruturou a Subseção da Associação Brasileira de Odontologia de Minas Gerais, em João Monlevade. Em 1964, criou, juntamente com os colegas Dr. Olavo Barbosa e Dr. Sylvio Menezes, a Policlínica Dentária de João Monlevade, redigindo seu estatuto – um conceito organizacional muito inovador para época. Seu vasto currículo profissional era constantemente atualizado por participação em congressos nacionais, internacionais e simpósios. Foi um assíduo colaborador dos trabalhos assistenciais da Sociedade de São Vicente de Paulo e participante do Movimento Familiar Cristão. Foi presidente do Ideal Clube. Um perfeito cidadão, profundamente imbuído de preceitos humanitários e sociais. Em 1961, observou que os boletins escolares do Grupo Escolar Eugênia Scharlé exibiam por escrito a “classe social” do aluno e protagonizou uma célebre querela com os mantenedores daquela instituição de ensino, com intuito de remover aquele item impiedoso, discri-minatório, desnecessário e sem suporte fático para tal determinação.
Muito se sabe dos feitos, da generosidade e da competência profissional do Dr. Oscar, mas pouco se conhece, de fato, sobre a vida deste ilustre “quase” cidadão monlevadense, muito reservado quanto ao falar de si, pelo que alinhamos um breve histórico biográfico.
De Alagoas para Minas Gerais!
Nasceu a 16 de fevereiro de 1917, em Anadia, Alagoas, cidade onde sua mãe era professora da rede pública e seu pai comerciante e proprietário de terras. Viveu no sertão, nas fazendas de gado e plantação de algodão da família, próxima ao Quilombo dos Palmares. Com a morte prematura do pai, a mãe e os oito filhos vão para Maceió e passam morar no casarão do avô materno, um major da Guarda Nacional, que outrora participara ativamente do Movimento Republicano e fora deputado estadual por vários mandatos durante o primeiro quartel do século XX. O pai do major,seu bisavô, era professor de latim e francês e fora adido da Instrução Pública em Pernambuco. Neste ambiente de cultura, tem o compromisso com o saber e o conhecimento mais fomentados.
Concluído o Liceu na capital alagoana, prossegue os estudos universitários, cursando de Medicina, no Recife. Mas por influência de um irmão mais velho, Gastão, acadêmico de Odontologia em Fortaleza, transfere-se para aquele Estado, faz reopção do curso e gradua-se em Odontologia no dia 16 de dezembro de 1944, pela Faculdade de Farmácia e Odontologia do Ceará.
De família abastada e influente politicamente, vivenciando as benesses de um avô, respeitado, sobrinho-neto de 2 ex-governadores de Estado e primos que ocupavam altos cargos públicos, ele teve, como qualquer órfão, de trabalhar com afinco para se manter. Lecionou, exerceu vários ofícios e prestou concurso para os Correios, sendo aprovado com a maior pontuação.
Durante a Segunda Guerra, embora civil, mas por ser reservista formado em Odontologia, foi convocado pelo Exército Brasileiro e integrou o Pelotão de Saúde, deslocando-se em comboio marítimo a bordo do navio Itapé, em ações de proteção aos navios mercantes e de passageiros que navegavam na costa brasileira, dentre outras ações. É importante lembrar que, de março de 1941 a julho de 1944, 35 navios brasileiros foram atacados, com torpedos, tiros de canhão ou sofreram ataques aéreos, que resultaram em 1.081 mortes. Pelos seus relevantes serviços prestados ao Exército Brasileiro e à Nação , recebeu o título e as garantias de Ex-combatente da FEB.
Em 1947, estabelecido profissionalmente em Boa Viagem, centro geodésico do Ceará, casa-se com Maria Rosicler Queiróz Ribeiro, professora e contadora, oriunda de tradicional família de fazendeiros da região, dando origem a uma grande e bela família. A mãe de Dona Rose, como era mais conhecida, Francisca de Queiróz Ribeiro, era prima em primeiro grau da escritora Rachel de Queiróz. Em Boa Viagem, nascem os primogênitos Álvaro e Arnalda. Quando Alípia veio ao mundo, Oscar recebeu irrecusável proposta, proveniente do gabinete de Getúlio Vargas, para se transferir e trabalhar em Belo Horizonte.
Assim, em 1954, começa a saga mineira do casal. Viajaram num vôo da Panair, com os três filhos e as fiéis auxiliares: a babá Maria Áurea e a cozinheira Teresa. Chegaram a Belo Horizonte, pouco tempo antes do suicídio do então presidente Vargas. Com a súbita mudança dos rumos políticos, teve de reescrever a história de vida numa região desconhecida, sem o suporte das raízes familiares. O desafio começara. Após um longo ano de adaptação, vendo os recursos financeiros se esvaindo, participou de um processo seletivo do SESI. Assim, como cirurgião-dentista, é lotado no ambulatório de Aimorés, em março de 1955. Permaneceu lá por quase 5 anos e, neste período, nascem os filhos: Adélia, Adelina e Antônio. Em outubro de 1959, é transferido para João Monlevade e fixa residência no Bairro Vila Tanque, na rua 24, nº 3, ao lado do G.E. “Eugênia Scharlé”, onde morou por mais quase 30 anos.
A Carreira em João Monlevade!
O atendimento odontológico do Sesi era realizado apenas no antigo prédio da Assistência Médica, na Praça do Cinema. Quando foi celebrado o contrato do SESI com o Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos, passou clinicar no consultório da sede Sindicato, na Rua Paraúna. Em paralelo, montou a clínica particular nas dependências do Hospital Margarida, depois se transferiu para a Rua Sete, num cômodo da casa de D. Quinita e, finalmente, estabeleceu-se na casa da pracinha da Areia Preta até a aposentadoria.
Em João Monlevade, nasceram os caçulas Amélia e Arnaldo. Estava formada a grande família do casal Oscar e Rose – o bem mais precioso e único para eles. Os filhos estudaram no Grupo Escolar Eugênia Scharlé, cursaram o segundo grau no Colégio Estadual Monlevade, frequentaram o Social Club e Ideal Clube, fizeram a primeira comunhão na igreja Matriz e Palanque da Vila Tanque… Ou seja, participaram ativamente da vida sócio-cultural monlevadense e exerceram, inicialmente, as atividades profissionais na cidade que os acolhera por décadas, deixando um legado exemplar de dedicação e respeito ao trabalho.
Aposentou-se em agosto de 1987, após festividade de remissão da inscrição nº 1.304 no Conselho Regional de Odontologia de Minas Gerais, na sede em Belo Horizonte, . ” por merecer o reconhecimento da classe odontológica, considerando que no decorrer de toda sua vida profissional nunca sofreu qualquer penalidade ou infração ética”. Findo o ciclo profissional de 50 anos de Odontologia, praticada com amor e ética irretocável, mudou-se com a esposa para a casa de Vitória-ES, em 1989, onde se dedicou ao voluntariado, às longas viagens para o exterior, às leituras e caminhadas diárias no calçadão da praia de Camburi.
As dores da longa enfermidade jamais o privaram da serenidade, do bom humor e das atividades habituais. Faleceu em 04 de abril de 1996, recebendo honras militares no Cemitério Jardim da Paz, em Vitória. Sua esposa Rose, eterna e leal companheira ao longo de 50 anos, faleceu em 29 de dezembro de 2000.
*Seus oito filhos, pela ordem de nascimento e atividades profissionais são:
Álvaro E. Ribeiro Falcão de Almeida, médico-veterinário, professor da EV-UFMG
Arnalda E.Ribeiro Falcão de Almeida, licenciada em Estudos Sociais, tradutora de língua francesa.
Alípia E. Ribeiro Falcão de Almeida, advogada e cientista política.
Adélia E. Ribeiro Falcão de Almeida, médica e licenciada em Matemática.
Adelina E. Ribeiro Falcão de Almeida, cirurgiã-dentista
Antônio E. Ribeiro Falcão de Almeida, engenheiro
Amélia E. Ribeiro Falcão de Almeida, engenheira
Arnaldo E. Ribeiro Falcão de Almeida, jornalista, acadêmico de Direito.
*Texto escrito pela filha de Dr. Oscar e Dona Rose, Alípia Elena Ribeiro Falcão de Almeida.
Matéria publicada na edição de nº 163 do jornal “Morro do Geo”, de agosto/2012!
2 comentários “De Filho (a) pra Pai! – Vida e História do Dr. Oscar Falcão de Almeida!”
Eu tive a oportunidade de conhecer o Dr.Oscar e ser seu paciente lá na clínica da Areia Preta. Quando de repente tive uma dor de dente mortal, fui levado à sua clínica e atendido prontamente com aquele senso de humor e alegria contagiante dele! Por questão financeiras difíceis, minha mãe explicando bem pra ele, recebeu dele todo apoio e o respaldo! Pra ele, naquele momento, o principal era acabar com a minha dor e sofrimento! Acabou fazendo um extraordinário tratamento de canal entre outras restaurações.
Me lembro muito bem que a anestesia era aplicada em meio a uma cantarola,,brincadeiras e contos de casos, pra distrair daquela agulha longa e assustadora! Ele foi a minha primeira experiência num consultório de dentista e até hoje está na minha memória! O plano feito por ele funcionou e fui sempre atendido com respeito, humanidade! Eu sempre levava uma parcela do pagamento nas visitas, como ele havia dito pra minha mãe: “pague quando é como puder..! E assim foi feito! Foi, com certeza, um grande cidadão pra nossa cidade! Pra mim, foi uma honra tê-lo conhecido!
Dr. Oscar foi nosso vizinha na Vila Tanque e é isto mesmo que você descreveu, sempre simpático e alegre. Uma pessoa ímpar e um ser humano incrível. Prazer Ailton, em receber seus comentários e bom que estar interagindo conosco. Um abraço,